Os jardins do século XIX em Portugal

»
»
Os jardins do século XIX em Portugal

Se no artigo anterior abordei os jardins do século XIX de um ângulo geral, neste artigo gostaria de aprofundar um pouco a realidade portuguesa.

Os parques e jardins do século XIX em Portugal

Os espaços verdes que surgiram neste período estão intimamente ligados ao pensamento liberal que se impôs no pós-guerra civil onde o liberalismo saiu vitorioso sobre o absolutismo.
Um dos maiores impulsionadores dos parques e jardins do século XIX em Portugal foi o rei D. Fernando II quando decidiu reformar os jardins do Palácio das Necessidades, eliminando a sua original traça barroca para lhe imprimir um cunho romântico que exprimia o seu carácter de homem culto, “renascentista romântico”, ligado às artes e à natureza.
D. Fernando II aliou-se ao mestre jardineiro Jean Baptiste Désiré Bonnard (1797-1861) para alterar o conceito dos jardins em Portugal, com especial destaque para a região de Lisboa.
Se o rei foi o cérebro por detrás dos projetos, Bonnard foi o executante competente e de elevados conhecimentos técnicos e botânicos. A capacidade demonstrada pelo jardineiro francês granjeou-lhe o título de jardineiro real e permitiu-lhe o desenvolvimento e colaboração em diversos projetos representativos dos jardins do século XIX em Portugal.

A parceria entre D. Fernando II e Bonnard

Da colaboração entre estes dois homens surgiram alguns dos mais emblemáticos espaços verdes portugueses do século XIX.
Se a parceria teve início na reformulação dos jardins do Palácio das Necessidades, depressa se alargou. Sob a batuta de D. Fernando, Bonnard desempenhou um papel importante na reestruturação dos jardins de Mafra, nas obras do Parque da Pena, no desenvolvimento do Jardim da Estrela e do Passeio Público que foi o precursor da atual Avenida da Liberdade.

Os principais jardins do século XIX em Portugal

Jardim Tapada das Necessidades

Em 1742 D. João V adquiriu os terrenos e aí mandou erigir uma ermida, um convento e um palácio. O projeto desenvolveu-se de acordo com o estilo barroco, apresentando grandes alamedas destinadas à produção de diversos produtos agrícolas, incluindo cereais. Junto ao palácio e ao convento encontram-se o Jardim de Buxo e a Horta dos Frades que formavam dois patamares inspirados no estilo italiano.
Em 1843, D. Fernando redesenha todo o jardim, transformando parte das áreas destinadas à produção agrícola num jardim romântico, inspirado na corrente dos jardins ingleses.
Ao longo do século XIX, os jardins foram sofrendo intervenções, nomeadamente com a construção da estufa circular, dos campos de ténis e da Casa do Regalo.

Parque da Pena

Ladeando o Palácio da Pena, o Parque da Pena é o apogeu da estética romântica, plena de exotismo e de natureza. D. Fernando II criou uma verdadeira obra de arte natural, com espécies provenientes dos quatro cantos do mundo; entre elas, destacam-se para as magníficas camélias asiáticas que constituíam o adereço idílico que embelezavam os bailes e festas que o rei patrocinava. Por entre o exótico arvoredo, encontramos caminhos sinuosos que nos conduzem a locais de vistas magníficas como a Cruz Alta ou o Vale dos Lagos. Além disso, a beleza natural conjuga-se com pavilhões e pequenas outras edificações para criar cenários únicos, dignos de verdadeiros contos de fadas.

Jardins de Mafra

À semelhança do que aconteceu com os jardins do Palácio das Necessidades, a Tapada de Mafra foi um projeto de cariz barroco mandado erigir por D. João V para servir de parque de lazer e caça para a Corte.
Na segunda metade do século XIX a área original da Tapada é dividida, passando para os atuais 833 hectares. Em 1860 D. Fernando II leva a cabo uma reflorestação do espaço, moldando-o ao estilo liberal, exuberante que acolhe uma enorme diversidade de fauna e flora que, hoje em dia, aposta na preservação da riqueza natural que a constitui.

Passeio Público (Avenida da Liberdade)

O atual espaço ocupado pela Avenida da Liberdade e pelos Restauradores tem a sua origem no Passeio Público, um projeto murado do arquiteto Reinaldo Manuel, iniciado em 1764 a mando do Marquês de Pombal, após o Terramoto de 1755.
Rapidamente se tornou num dos espaços preferidos pela nobreza e estava interdito às classes mais baixas da sociedade. Apenas em 1821, mediante a ordem de D. João VI, os muros foram derrubados e o Passeio Público passou a estar acessível a todos.
Na primeira metade do século XIX, nomeadamente, entre 1830 e 1840, o Passeio Público foi submetido a alterações que incluíam fontes que simbolizavam os rios Tejo e Douro.
Entre 1879 e 1886 foi desenvolvida a avenida que hoje conhecemos à medida dos magníficos boulevards de Paris. A sua beleza e sumptuosidade impulsionaram a expansão de Lisboa para norte e atraíram as classes privilegiadas que aí mandaram erigir as suas residências, tornando a Avenida num dos corações da cidade e num dos mais icónicos jardins do século XIX em Portugal.

Jardim da Estrela

Ainda que a construção do Jardim da Estrela se tenha iniciado em 1842, o projeto só avançou verdadeiramente em 1850 por causa da instabilidade política da época.
Sob as ordens dos jardineiros chefe Jean Bonnard e João Francisco, o Jardim da Estrela foi-se desenvolvendo sob a inspiração dos jardins ingleses, do romantismo e do liberalismo, até ser inaugurado em abril de 1852 e tornar-se num dos locais da moda, onde os lisboetas passeavam por entre estufas, quiosques e até um pavilhão chinês.

Etiquetas:

por: Karine Moreau

Karine Moreau é uma arquiteta paisagista luso-francesa que, depois de se ter formado numa das melhores escolas da especialidade em França, estabeleceu-se em Portugal, mais precisamente em Sintra, para desenvolver a sua atividade profissional. Apaixonada pela natureza, pelo paisagismo e pelo urbanismo, coloca todo o seu profissionalismo e paixão ao serviço dos seus clientes – sejam particulares, empresas ou entidades públicas – por forma a criar espaços verdes que contribuem para uma melhor qualidade de vida.