O homem foi feito para caminhar

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O homem foi feito para caminhar

O Homem foi feito para caminhar mas não o faz

Nos primórdios da Humanidade, o Homem era um ser nómada, que se deslocava constantemente em busca de alimentos. Porém, com o passar da sua evolução e dos séculos, o Homem foi-se tornando um ser cada vez mais sedentário, trocando o caminhar e carroças pelo carro.

O uso cada vez mais comum do automóvel reduziu distâncias e o tempo de deslocação entre os mais diversos locais. Esta questão, aliada ao aumento de preço das habitações nos centros das cidades e à existência de áreas desocupadas nas periferias, levou a que cada vez mais pessoas se instalassem em suburbios.

O desenvolvimento das periferias impossibilitou as deslocações a pé das residências para os locais de trabalho, teve impacto extremamente negativo no meio ambiente e causou um enorme aumento de tráfego automóvel.

O nosso sedentarismo está a contribuir para a destruição do planeta, aumentando os níveis de poluição graças às emissões de carbono dos veículos que usamos para nos deslocarmos.

Proteger o ambiente

Por forma a reduzirmos o impacto do automóvel no meio ambiente há que apostar na mobilidade urbana sustentável, apoiada em estratégias que dinamizem a introdução dos transportes suaves, sejam os transportes colectivos, a bicicleta ou o andar a pé, nas políticas de gestão territorial, assente em pilares como a estrutura ecológica, a estrutura verde concelhia, a hieraquização das vias de comunicação.

Para estimular o recurso aos transportes suaves, preconizamos medidas como:

  • Incremento e melhoria da rede de transportes coletivos, tornando-os apelativos para as deslocações mais longas;
  • Criação de ciclovias e de equipamentos ligados à mobilidade reciclável, como mecanismos de bike sharing;
  • Criação de percursos pedestres, incentivando as deslocações a pé em detrimento do automóvel.

Os malefícios do sedentarismo para a nossa saúde

Ao trocarmos as nossas pernas pelas rodas do automóvel estamos a colocar em perigo a nossa saúde, potenciando doenças como a obesidade, a diabetes, o cancro ou os AVCs.

O que fazer?

Está na hora de alterarmos esta situação, recuperando o velho e saudável hábito de caminhar.

Isto não significa que tenhamos de fazer uma maratona todos os dias. Basta tomar algumas pequenas ações, como por exemplo:

  • Deixe o seu automóvel parado nas deslocações mais pequenas, percorrendo-as a pé. Pode começar por estipular um raio de 3 km para as suas deslocações a pé e ir aumentando os quilómetros à medida que for recuperando a sua forma física e o prazer de caminhar for sendo cada vez maior;
  • Ao fim de semana, troque o shopping por um espaço verde da sua cidade e desfrute de uma bela caminhada pela natureza, respirando ar puro.

Caminhe pela sua saúde e pela saúde da Terra

Além de estar a contribuir para reduzir as emissões de carbono para a atmosfera, o caminhar reforça a sua saúde e, por conseguinte, dá-lhe qualidade de vida.

Os principais benefícios das caminhadas para a sua saúde

  • Ajuda-o a atingir e a manter um peso saudável;
  • É um excelente desporto de tonificação muscular, ajudando a proteger a estrutura óssea. Isto é especialmente importante para prevenir doenças reumatológicas como a osteoporose. Em termos ósseos a caminhada é também importante por aumentar o nível de fixação de vitamina D;
  • Contribui para atenuar o stress, a ansiedade e até mesmo a depressão, ajudando à melhoria do humor;
  • Contribui para diminuir o risco de aparecimento de cancro;
  • Ajuda a prevenir a diabetes;
  • Diminui o risco de doenças cardio-vasculares;
  • Ajuda a aumentar os níveis de imunidade do organismo;
  • Segundo um estudo da Public Health England, reduz o risco de morte prematura em 15%.

Por fim, gostaria de partilhar convosco experiências vividas de caminhadas, na esperança que estas vos incentivem a regressar ao nosso propósito inicial de que o Homem foi feito para caminhar.

O Homem foi feito para caminhar – Testemunhos de caminhantes e peregrinos

” EXPERIÊNCIAS VIVIDAS

Os pés assentes na terra: leitura da Natureza e da Paisagem

“É de sensações que vim à procura quando decidi ir a pé para Portugal. Paris-Porto, a pé, em 105 dias. Filha da sociedade de consumo e dos surbúrbios da região parisiense, cresci num bairro social onde um dos únicos locais de convívio era o supermercado. Passei tardes a ver televisão comendo as bolachas apresentadas nos reclames; e por sorte, nunca fui obesa! De uma vida pobre em sensações, decidi viver uma experiência no exterior, ser nómade sentir e avançar com a energia dos meus músculos. Apanhar chuva e calor, sentir o verdadeiro cansaço físico, sentir a fome saciada por uma refeição profundamente apreciada. Dormir ao ar livre e acordar com orvalho no meu rosto. Dormir de olhos abertos e sentir ao longo da noite a presença dos animais. Viver ao ritmo do nascer e por do sol, e ler somente até o crepúsculo. Conhecer pessoas e criar laços imediatos, francos e verdadeiros. Alcançar a infinitude com a presença contínua do céu e esperar a nuvem amiga que nos irá proteger por momentos do sol escaldante. Sentir a sede e perceptir a temporalidade da Natureza. Um dia na Natureza equivale a uma semana na Cultura. O tempo é perceptido sem limites, com infinitude, lá nunca temei a minha própria finitude.”

“Atravessei os vales do rio Sena, do rio Loire, do rio Garonne. Percorri a floresta de Orléans, e o planalto de Millevaches. Atravessei a barreira dos Pireneus e circundei seus colos, cheguei à cidade de Pamplona e deixei o país Basco. Percorri os campos de trigo de Navarra e bebi o vinho da Rioja. Segui os canais de água das planícies de Léon e alcancei os montes graníticos da Galiza. Atravessei o rio Lima e cheguei a Portugal, segui os caminhos de pedra e as vinhas em latada. Aproximei-me da cidade do Porto, mas não continuei. Um incêndio devastou a mata que iria atravessar.”

“Essa viagem despertou as capacidades de adaptação do meu corpo e o seu poder plástico de transformação. Lentamente, ele modelou-se e redescobriu o para quê que é destinado: a caminhada é sua casa. Essa primeira experiência sensorial com os pés em contacto com o solo reconectou-me ao nosso meio-ambiente: a terra, o céu, e o espaço onde me senti em acção, e fazendo parte do universo, do seu todo. A pouco a pouco, a caminhada e o ritmo que ela impõe, como o cansaço que ela nos faz suportar, ajudou os outros sentidos a abrirem-se ao mundo: o olhar aguçou-se, mais preciso, mais receptivo e mais claro. Os detalhes apareceram com toda a riqueza que eles detinham. O espaço era cada vez mais vasto quando abrandávamos o ritmo, e a caminhada tornava-se rápida demais. O tato e o olfato estavam permanentemente em alerta delimitando os contornos do nosso corpo. Tinha a sensação de mergulhar num banho sensorial para nunca mais atravessar o vazio do ar. A caminhada permitiu-me explorar os meus sentidos doravente capazes de perceber a Natureza e o seu impulso de vida, com o qual vivemos em ressonância. Ela fez recordar-me o quanto somos um corpo que pensa e não um pensamento móvel. O nosso lugar encontra-se neste meio, nesta Natureza, quer que seja bela ou não, mas que exige a participação ativa do nosso corpo para nos acolher e revelar a sua beleza.”

Inspire-se neste artigo e caminhe por si e pelo planeta.

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por: Karine Moreau

Karine Moreau é uma arquiteta paisagista luso-francesa que, depois de se ter formado numa das melhores escolas da especialidade em França, estabeleceu-se em Portugal, mais precisamente em Sintra, para desenvolver a sua atividade profissional. Apaixonada pela natureza, pelo paisagismo e pelo urbanismo, coloca todo o seu profissionalismo e paixão ao serviço dos seus clientes – sejam particulares, empresas ou entidades públicas – por forma a criar espaços verdes que contribuem para uma melhor qualidade de vida.